A busca por desempenho e resultados positivos, se possível melhores a cada dia, é preocupação constante da maioria das pessoas – pelo menos daquelas com funcionamento saudável. Para isso, alternativas e possibilidades são buscadas. É preciso agregar ao que se tinha antes, para o subsistema pessoal evoluir, incentivando-se e contribuindo com o contexto do qual faz parte. Assim, tudo tende para uma situação cada vez mais complexa, mesmo na simplicidade, dentro do que lhe é próprio e em harmonia com essa relação sistêmica em que tudo se conecta. Um organismo bem-sucedido atende ao que se espera dele, preenchendo, justificando seu lugar no mundo e evoluindo constantemente para um determinado fim.
Carl Rogers, o grande psicólogo humanista, observando que brotos de batatas, armazenadas num porão, buscavam naturalmente a luz solar, retorcendo seus caules na direção de aberturas por onde penetravam raios de sol, transpôs esse fenômeno, chamado de heliotropismo, para o ser humano. Concluiu que cada pessoa tem uma tendência natural para a realização do potencial pleno. Em situações naturais, cada um evolui, atualizando-se (no sentido de tornar ato o que é potência) constantemente para uma posição de funcionamento pleno, onde pode ser feliz – a realização desse potencial é o sucesso do organismo enquanto tal. Desvios do caminho ou qualquer impedimento desse progresso levam a adoecimentos psíquicos ou físicos (somatizações) de diversas naturezas.
Até aqui, nenhum problema. É da natureza. O bicho pega quando se confunde sucesso com “dar-se bem na vida”, preenchendo um papel fantasioso, ditado pelo consumismo, modismo ou busca de status, que nada tem a ver com a demanda íntima por uma evolução do ser. Alimentando o aparente, a exterioridade, o indivíduo perde contato com o interior e se desvia da sua essência.
A busca desesperada por esse sucesso equivocado pode levar o indivíduo ao anseio de acertar sempre. A cada acerto, pode julgar-se melhor e mais capacitado do que realmente é. E, em contrapartida, cada erro pode jogá-lo num inferno mental, levando-o a se considerar um caso perdido, um incompetente, num juízo negativo extremo, mas irreal tanto quanto o outro. Numa direção, pode desenvolver crenças e pensamentos automáticos de um funcionamento ótimo. Noutra, de forma semelhante, ocorrem as crenças e os pensamentos automáticos de ser um fracasso, que nada faz de correto. As duas situações vão exigir da pessoa uma análise do modo de pensar para encontrar evidências que as confirmem ou derrubem, a fim de desmontar esquemas equivocados e adotar a postura mental mais saudável e adequada à realidade.
O anseio pelo sucesso mundano a todo custo pode levar à autoimagem mítica de supereficiência e repúdio ao erro e ao fracasso. É sabido, vários pensadores e filósofos da ciência exploraram esse tema, que todo avanço é uma somatória de erros e acertos. Não se acerta ou se erra sempre. O próprio erro, uma vez refletido e analisado, acaba sendo fator inovador, impulsionando o progresso.
Errar e acertar são da nossa natureza. Se tomarmos os dois casos como as margens de uma estrada por onde caminhamos, vamos perceber que, ao acertar, aproximamo-nos da margem do erro, porque não vamos acertar sempre. Da mesma forma, errando, aproximamo-nos do acerto, pela mesma razão de que não vamos errar sempre. Estudando igualmente erros e acertos, avançamos rapidamente rumo à realização. O atraso e a demora ao longo do caminho devem-se à comemoração exagerada dos acertos ou à execração injustificada dos erros, sem a necessária e proveitosa reflexão sobre um e outro. Desvalorizar e tentar esconder erros e fracassos e, de certa forma, supervalorizar os casos de êxito, levam o indivíduo a perder excelentes oportunidades de aprendizado.
O esforço é grande, mas necessário. Aprender com os próprios erros é combustível valioso demais para ser deixado de lado. Ao perceber isso, passamos a valorizar os insucessos tanto quanto os sucessos. Não seremos mais abatidos por aqueles. Nossa tristeza, quando acontecerem os tombos, terá a medida justa para cuidar da ferida, tomar a lição e seguir em frente. Deixar-se ficar, numa postura de autopiedade ou de vítima do cruel destino, nada acrescenta. No outro sentido, como os heróis da mitologia grega, saber-se investido de um mandato a ser cumprido, com e apesar de todos os percalços do caminho, torna a pessoa cada vez mais apta e competente, desenvolvendo resiliência. É nesse embate de forças aparentemente (e reforço esse aparentemente) antagônicas, nesse encontro do cinzel com a pedra, que se forja o herói.
De onde vem essa presunção de nunca errar, esse repúdio contraproducente ao fracasso? Provavelmente da vaidade de se exibir no mundo como um ser maior do que é. Da pretensão de preencher um molde que não lhe é próprio e parecer grandioso aos olhos de uma plateia ingênua e inconsciente, porque composta da mesma categoria de indivíduos. Oscar Wilde, em O retrato de Dorian Gray, deixou-nos uma metáfora perfeita para isso. Dorian Gray, o herói da história, aparecia, aos olhos da sociedade, pleno de beleza física, jovialidade e sucesso, enquanto seu retrato, que era, de fato, sua verdadeira essência, envelhecia e se tornava uma monstruosidade.
Como quebrar esse círculo vicioso? Karl Popper, filósofo da ciência, dizia que todo projeto humano que visa apenas ao acerto e à evitação do erro a todo custo tende a ser um projeto pobre, limitado e pouco ou nada inovador. Projetos realmente originais e criativos admitem os erros como algo decisivo, com os quais se aprende tanto quanto com os acertos. Erros podem ser professores ainda melhores que os acertos, dependendo de como os enfocamos.
Não há como não errar. Para isso seria preciso nada fazer, nem tentar. Mas isso, em si, já é um erro. Tal como a “não escolha” já é uma escolha. Estamos condenados à liberdade, pontuaria Sartre. Então, sejamos sensatos – é o que se espera. Aprendamos com os erros para caminharmos mais assertivamente.
Causas de erro, encontramos por toda parte, mas especialmente em nossa própria mente. O desejo irreal de tudo controlar e sempre acertar é nosso grande inimigo. Elaboramos crenças negativas, como já vimos, que exigirão esforço para serem desmontadas. Elaboramos a armadilha dos esquemas na qual nos prendemos. Energia e tempo serão necessários para desarmá-la.
Entre os fatores que podem tornar o indivíduo mais humilde e, ao mesmo tempo, mais ativo em favor da própria construção, estão a coragem para acolher o que vier, sem se achar um semideus, com amplos poderes e capacidade de controle; a sensibilidade de ver-se como elemento de um processo maior ou, se preferir, de um subsistema dentro de um sistema mais amplo e complexo e, sobretudo, a autovisão de detentor de um mandato e de possibilidades únicas e um ser necessário para a harmonia geral. Aprender com erros e acertos é inevitável na atualização do ser e na realização das possibilidades individuais.
Questionando nossos pensamentos, buscando evidências que desmontem ou confirmem nossas crenças, mantendo-nos vigilantes em relação aos nossos pensamentos automáticos, acautelando-nos contra esquemas escravizantes e aprendendo a dialogar, ouvir e trocar ideias com os outros, numa interação que deve somar, mas não prender, são recursos valiosos para escapar da ilusão do sucesso perene e valorizar devidamente os erros.
Fernando Pessoa endossaria: “Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena”.
Fonte: http://www.rh.com.br/Portal/Carreira/Artigo/9115/erros-podem-ser-bons-caminhos-para-o-sucesso.html